Este é o meu relato de parto que
aconteceu em 02 de dezembro de 2008. Foi sendo escrito aos poucos quando em 2010 ele ficou pronto.Hoje tenho a maturidade
e o desprendimento para compartilhar essa história no blog.
Disseram que Julia estava
pélvica. Pélvica é uma posição atualmente considerada pelos médicos como de
risco, mas eu sei que ela é apenas uma posição incomum e rara e por isso é
preciso alguém que saiba realizar esse tipo de parto. Mesmo assim fiz massagens,
exercícios e muitas orações para que ela virasse.
Quando Julia nasceu estava com 42
anos e meu GO disse que eu era muito velha para um parto normal, mas me sentia
saudável e em condições de parir.
Quantas vezes eu fugi da cesárea,
por saber das desculpas esfarrapadas dos "especialistas"? Muitas. Porque
esse era o meu desejo, porque eu já imaginava o que a cesárea fez com o meu
corpo e porque queria sentir a "dor do parto" como uma bênção.
O que pude sentir na dilatação é que dói, mas
uma dor suportável, bela e engrandecedora.
Busquei informações e fui me
preparando para um parto normal, que virou natural humanizado e transformou-se
num parto domiciliar. E apenas descobri minha gravidez já com 17 semanas, mas
isso é outra historia!
Minha bebê estava pélvica durante
toda a gestação e eu sempre acreditei que ela viraria, mas não virou. Mesmo
assim me informei e acreditei que era possível um parto domiciliar com ela
pélvica.
Entrei em trabalho de parto ainda
querendo que ela virasse, contrações leves, rompeu o tampão e das 10 da noite
ate às 06h30min eu dilatei 7 cm.
Foi quando Julia mudou de posição e ficou transversa. Minha parteira Vilma
disse: “Precisamos conversar” e eu ouvi: “O gato subiu no telhado”, mas ela
dizia: “ Sua barriga está alta, você dilatou, sua bolsa ainda não rompeu. Nessa
posição é arriscado ficar em casa, é o momento de ir para o hospital." Eu
ouvi, mas não entendi. Queria pedir para ficar, mas ela era a pessoa que eu
tinha escolhido para me dizer o que fazer. Então acreditei nela, obedeci. Meu
amado Lui, Marjorie doula e minha mãe fizeram uma mala às pressas e fui com o
coração apertado. Tremendo de medo por dentro.
Como o trânsito estava parado,
mas as contrações só aceleravam paramos uma ambulância do Corpo de Bombeiros e
pedimos para nos levarem até o Hospital Pedreira. Foi um momento que pude
relaxar com a conversa dos bombeiros, visto que um deles colocou luvas e disse
pra eu ficar tranqüila que se o bebê nascesse ali ele ajudaria. Pude rir por
dentro porque essa era a única certeza que eu tinha que Julia não ia nascer
assim e era justamente por isso que estávamos indo para o Hospital. As
contrações estavam mais seguidas e mais doloridas, então não conseguia ficar
deitada
Eu estava morrendo de medo, quis
fugir do hospital, mas minha querida doula Marjorie me salvou nessa hora
dizendo que minha filha iria nascer e tinha chegado a hora, aqui ou em outro
hospital. Sua presença foi fundamental naquele momento, pois minha vontade era
sair correndo dali e fugir enquanto aguardava o médico chamar.
Hospital público se espera e mais
contrações, Marjorie me massageando. Chamam meu número. Sem me olhar o doutor disse que teria de ser
removida, pois não havia vagas. Então veio o exame de toque, dilatação total 10 cm. Fiz cumprimentos mentalmente.
Só que o tom da conversa mudou. Chamou enfermeira: “Prepare o centro cirúrgico
já.” Eu chorava de medo, medo de ser cortada e de minha recuperação, de não
poder cuidar de minha filha de tanta dor, mas em momento algum senti que ela
corria perigo.
No centro cirúrgico eram duas
médicas, só fiquei sabendo na saída da maternidade. Elas nem se apresentaram. Tocou
um celular e eu falei: Aqui não é lugar de celular. A enfermeira veio me
acalmar. “Ouço alguém dizer: “Vou fazer
um exame de toque” E eu: “Não precisa, a dilatação é total, ela esta pélvica
(pois eu não tinha entendido que ela estava transversa) e vai ser cesárea.” A enfermeira
percebeu meu estado alterado e segurou na minha mão, olhou nos meus olhos e
disse que iria cuidar de mim e que estava tudo bem. Durante a cirurgia eu
conversava com a Julia e orava em tom baixo. Veio a enfermeira no meu ouvido e
disse: “A Dra pediu para parar, porque esta atrapalhando ela. ”Mas não quis
obedecer. Não parei porque sabia que ali era momento meu e de Julia e que poderíamos
contagiar a sala. Queria essa conexão, esse contato e esse clima para seu
nascimento, que foi 9:44 da manhã, sem choro. Esta foi sua primeira lição para
mim e me acalmei. A enfermeira veio cochichando dizer que ela tinha nascido
fazendo cocô e xixi em cima de todo mundo.Rimos cúmplices. Presenciei as
intervenções: colírio, aspiração e vitamina K injetável. Então Julia chorou.Ficava
conversando com ela e dizendo: "Eu estou aqui, sou Ana ,sua mãe e tudo
está bem, seja bem vinda, eu te amo".As enfermeiras foram verdadeiros
anjos, pois me olharam nos olhos e puderam cuidar dos meus medos.
Trouxeram Julia para o meu lado enquanto
ainda me costuravam, ela não chorava o que me acalmou muito. Julia me cuidou e
naquele momento nasceu a mãe em mim!
Depois fomos para sala de
recuperação e ficamos juntas. Deixaram meu amado companheiro Lui entrar. Eu
estava sedada, doída, mas nada disso importava porque tinha Julia nos meus
braços mamando.
Chorei quando já estava em casa só
depois de dois dias e pensei que era menos mulher por não ter podido parir. Mas
hoje sei que não tenho esse controle. É preciso como diz Ana Cris: “Ter
flexibilidade na alma para suportar como a vida nos apresenta as situações: que
não era a que desejávamos ou esperávamos, mas a que precisamos ter para
crescer, aprender e amadurecer na vida.”
Pra mim o único caso que
admitiria uma cesárea é se ela fosse necessária.
E percebi que nem assim foi fácil
de engolir. Antes, era como se todas as cesáreas fossem desnecessárias. E justo
a minha não foi... Precisei fazer as pazes e agradecer pela cesárea existir.
Fazer parte das maternas é apoiar a cesárea necessária, bem indicada,
consciente que este foi o melhor jeito de Julia chegar ao mundo.